Os professores dos três agrupamentos de escolas fizeram-se ouvir esta segunda-feira em Chaves com palavras de ordem dirigidas ao primeiro-ministro e ao Governo: “Oh Costa respeita a escola”, “Governo escuta, a escola está em luta” e “Não paramos” foram algumas das palavras que demonstraram o descontentamento dos docentes. Os alunos, que hoje não tiveram aulas, também se juntaram à luta em solidariedade.
No dia em que estava prevista greve no distrito de Vila Real, convocada por oito organizações sindicais, o Largo General Silveira foi o ponto de encontro da manifestação dos professores flavienses. Centenas de docentes, não docentes e alunos saíram pelas 9h dos três agrupamentos de escolas e marcharam com palavras de protesto até ao centro da cidade.
Dulce Salgueiro dá aulas de Português há 35 anos. Desde o dia 9 de dezembro que esta docente da Escola Secundária Dr. Júlio Martins está em luta. Hoje voltou à rua para se juntar aos seus colegas de profissão porque considera que o ensino em Portugal se tem vindo a “degradar nos últimos anos” e que é preciso dizer “basta” contra os sucessivos ataques do Governo.
“Temos falta de pessoal auxiliar, de psicólogos, de terapeutas da fala, de professores de ensino especial, temos falta de condições nas escolas. O Governo tem vindo ao longo destes anos a desinvestir na Educação. Estava na altura de dizermos basta pelo bem da escola pública e pelos nossos alunos”, refere a professora.
A colocação de professores a quilómetros de distância de casa, a nova legislação sobre mobilidade por doença, o não reconhecimento dos seis anos de serviço pela tutela e o excesso de burocracias e “grelhas” impostas aos professores são outro dos motivos que movem estes profissionais.
Milhares de alunos sem aulas em toda a região do Alto Tâmega e Barroso
Tudo isto “não enriquece em nada a educação dos nossos alunos. Pelo contrário, rouba-nos tempo para aquilo que é essencial que é estar na sala de aula a ensinar os nossos alunos”, disse.
Dulce Salgueiro fala em desmotivação pela carreira e em exaustão dos professores: “Sempre gostei de dar aulas, sinto-me feliz na sala de aula, eu gosto dos meus alunos, gosto de interagir. Eu só não gosto de tudo o resto que está à volta da escola e que me cansa muito e que me tira as energias para ensinar os meus alunos”, sublinha.
Quase em final de carreira, esta flaviense reivindica ainda “uma reforma digna” e “com alguma saúde mental”: “O desgaste mental é muito grande. Temos turmas enormes, com 28 alunos. Não é fácil querer acudir a todos. Na minha direção de turma tenho dois alunos de ensino especial e eu não tenho qualquer preparação para trabalhar com estes alunos e não tenho colegas que me possam auxiliar porque há muito pouca gente que esteja preparada para ajudar nestas situações".
A luta que tem movido os professores de todo o país deixa esta responsável satisfeita, uma união que “estava a faltar” e que na sua opinião muito tem contribuído a ação de André Pestana, da estrutura sindical STOP, para despoletar este movimento reivindicativo, embora muitos dos professores não sejam sindicalizados, lembra a professora.
Além dos professores flavienses, a manifestação contou com docentes das escolas de Boticas, Montalegre e Valpaços, deixando milhares de alunos sem aulas em toda a região do Alto Tâmega e Barroso.
"Não são serviços mínimos, são serviços máximos"
“Os professores aderiram em massa à greve, os alunos também e, portanto, penso que grande parte das escolas não funcionaram e conseguimos mostrar de facto o nosso descontentamento”, salientou Dulce Salgueiro, garantindo, no entanto, que os alunos não seriam prejudicados.
“Nós estamos cá para os ajudar, estamos cá por eles. O país e os pais devem pensar no que é melhor: Se é esta paragem agora e tentar melhorar a escola pública ou se será melhor daqui a dois ou três anos não termos professores, como já vai acontecendo agora”, acrescentou.
Questionada sobre os “serviços mínimos” que as escolas passaram a garantir desde quarta-feira passada, Dulce Salgueiro considera que é “um atentado à democracia” e a retirada de um direito adquirido com o 25 de abril: “Parece-me que convocar serviços mínimos em que estão convocados, por exemplo, seis funcionários da parte da manhã, seis funcionários da parte da tarde, quando no todo na escola, se calhar, pouco mais há do que 12, isto não são serviços mínimos, são serviços máximos”, afirmou.
Os professores querem que o Ministério da Educação se sente à mesa das negociações de “boa fé” e com “propostas que sejam exequíveis e que possam ser aceites pelos sindicatos”. Amanhã é a vez do protesto dos professores no distrito de Viseu. Dia 11 de fevereiro está agendada uma mega manifestação em Lisboa.
Pagar para trabalhar
Júlio Jesus é professor do ensino básico de Educação Visual e Tecnológica. Também ele percorreu as ruas da cidade de Chaves em protesto pelo ensino público. No seu entender, tem existido nos últimos anos um descrédito na classe dos professores e que chegou o momento de se unirem na reivindicação dos seus direitos.
Sem colocação no distrito desde que acabou em 2008 a licenciatura, este flaviense lamenta que os professores tenham de andar sempre “com a casa às costas” e critica o facto de nunca ter tido a oportunidade de puder trabalhar na sua terra.
Recentemente conseguiu um horário de contratação de escola no Porto, mas rapidamente percebeu que não tinha condições para lecionar naquele estabelecimento de ensino: A viagem, a estadia, a alimentação e outras despesas eram tudo custos que o salário de professor não dariam para pagar.
“Provavelmente não iria ganhar 900€ líquidos. Ou seja, ia trabalhar mas não ia ser remunerado… basicamente pagamos para trabalhar e essa é uma experiência terrível”, acrescida do facto de estar longe da família, apontou.
“Este é o momento certo para que o primeiro-ministro e o ministro da Educação olhem para nós de outra forma porque nós não vamos parar”, garantiu.
"Fazem tanto por nós e pelo nosso futuro"
Júlio Jesus diz ainda que entende a insatisfação dos pais e encarregados de educação por não puderem deixar os filhos na escola, contudo, salienta, que esta luta é necessária para que os professores consigam dar aulas “muito mais motivados” e com “muita mais força” para que os filhos cheguem a casa também muito mais satisfeitos.
Os próprios alunos “percebem que o professor se sente prejudicado. Todas as classes precisam de se sentir valorizadas e os professores precisam de se sentir valorizados”, notou.
Vários alunos juntaram-se também esta manhã à marcha pela Educação em Chaves, em solidariedade com os professores.
“Achamos que temos de ter este gesto de solidariedade pelos professores que fazem tanto por nós e pelo nosso futuro. Todos os dias vemos que estão extremamente cansados por causa da burocracia a mais ou mesmo por aqueles que estão longe de casa... como uma professora que estava a 600 quilómetros de casa, o que é completamente impensável”, declarou Guilherme Trinta, vice-presidente da Associação de Estudantes da Escola Secundária Fernão de Magalhães.
Este aluno do 12º ano acredita que sendo a Educação um pilar fundamental da sociedade é lamentável que os seus profissionais sejam constantemente desvalorizados e não sejam respeitados nem tratados com as condições que merecem.
"Isto é uma luta dos professores, mas também de uma sociedade inteira"
Guilherme Trinta assegura que as greves dos professores acabam por prejudicar de certa forma o normal funcionamento do ano letivo, porém, sustenta, que é “um barulho que tem de ser feito” para que sejam ouvidos.
“Isto é uma luta dos professores, mas também de uma sociedade inteira. Eles são o pilar da sociedade e é gratificante ver alunos de todos os anos a participar numa manifestação que é dos professores, que não é dos alunos, mas é pela sociedade”, esclarece.
Guilherme Trinta admite que no passado considerou seguir a profissão de professor, contudo neste momento confessa que a carreira é “muito incerta”, sobretudo pelo concurso de colocações que obrigam muitos professores a estarem longe da família.
“É uma profissão que já considerei, mas... da maneira que está é praticamente impossível”, concluiu o dirigente estudantil.


































































































































Professora Dulce Salgueiro

Professor Júlio Jesus
