Este sábado passado ouvi falar em envelhecimento activo a uma jovem psicóloga que segundo a própria está naquilo a que se chama a casa dos trinta sorri de mim para mim sobre esse subterfúgio de não conseguir assumir o número concreto da sua idade dado que é atraente sexy chamativa e brilhante ainda consegue escapar à ditadura da idade do tempo embora eu já esteja naquela fase em que duro não faço anos continuo a ter sonhos e a insistir em que ainda sou alguém em termos sociais com opinião e vontade própria ainda que esta depressão que persiste em permanecer melhor e a ter recaídas nem sempre compensatórias ou tão pouco satisfatórias sinto que estou numa das muitas encruzilhadas com que a vida nos proporciona usufruir isto é apenas mais uma no entanto dado que tem um cariz universal e pois todos estamos perante uma sociedade esquizofrénica que nos questiona de momento a momento ainda que se olharmos à nossa volta deparamo-nos com situações de tal forma complexas que só milagres nos libertariam e como os milagres não são para qualquer um é necessário ter características específicas e sobretudo uma lucidez realmente transparente e isenta às vezes deixo-me ir na espuma dos dias nas razões do tempo e quase desisto de lutar pelos ideais que me movem depois a própria sociedade se encarrega de me lembrar de forma subliminar que já estou na curva final do último lustro isto se durar até ao centenário como pretendo e ainda tenho sonhos anseios desejos a satisfazer partilhas a dividir sinto que sou útil e sou competente pelo que a indiferença dos outros mas sobretudo a condescendência dos que vêm mesmo atrás de mim me irrita solenemente mas o que fazer é a ordem natural das coisas também já fui assim com outros que tal como eu tinham tanto a partilhar e não lhes dei essa oportunidade o que me acontece é o que aconteceu aos que me antecederam por isso talvez sinta essa necessidade física de partilhar experiências vivências eternizando-as na escrita para que os que estão agora a chegar se consciencializem que a partilha transparente autêntica é o caminho a seguir talvez ou melhor provavelmente não poderei ensinar tudo quanto sei mas se conseguir partilhar algo do que vivenciei possivelmente vou sentir-me realizada e os outros aprenderão a entender o meu objectivo e a minha forma de viver o meu tempo usando-o com a liberdade que o meu ritmo permite por isso sinto que envelheço com classe e sobretudo consciente de dar o meu melhor.
Manuela Rainho é moçambicana, septalescente assumida e reformada do ensino secundário. Desde muito nova que gosta de escrever. Foi sobretudo em Chaves, onde reside há cerca de 37 anos, que se iniciou como cronista e articulista de opinião. Este tipo de crónicas, que agora começa, pretende ser uma homenagem a grandes escritores que admira profundamente: José Saramago e Luís Sttau Monteiro.